Todos nós temos o nosso próprio espaço de vida, o lugar onde nos sentimos confortáveis, como se estivéssemos em casa. Também temos as nossas rotinas, hábitos e aquela lista de preferências que nos tornam únicos. Cada um de nós, em última análise, tem o seu próprio nicho ecológico, um conceito extensivo para cada espécie que partilha a Terra connosco. Daí resulta um importante processo ecológico, como a competição ou a especiação, um conceito chave para compreender a montagem e dinâmica dos ecossistemas naturais.
Quando lhe perguntam como descreveria as pessoas próximas, a primeira coisa que lhe vem à mente é a sua forma de estar quando está com elas e o que elas adoram fazer. Sabemos qual é a primeira coisa que eles perguntam sempre num restaurante, o que os irrita, que sítios gostam de frequentar, o que gostam de fazer quando têm tempo livre e até como se comportam quando gostam de alguém. Se também já vivemos com eles, podemos adivinhar quase a sua rotina diária desde que acordam até se deitarem. Embora nem sempre tenhamos o mesmo comportamento, existem muitos traços, passatempos e rotinas que nos caracterizam e diferenciam. Cada um de nós tem a nossa zona de conforto, os nossos passatempos, preferências alimentares e pessoas com quem adoramos passar o nosso tempo livre.
O NICHEIRO ECOLÓGICO DE UMA ESPÉCIE
Este “espaço vivo” que todos nós temos e no qual nos sentimos identificados, é também comparável ao nicho ecológico dos organismos. O nicho ecológico de uma espécie é um conceito que sempre nos foi apresentado como a “ocupação”, “profissão” ou “trabalho” que um organismo carrega no local onde vive (Wikipedia ou CONICET), mas a definição inclui mais do que isso. Hutchinson (1957) definiu-o como: “hipervolume n-dimensional, onde as dimensões são condições e recursos ambientais, que definem os requisitos de uma espécie a persistir ao longo do tempo”. Apesar da definição confusa, está interessado em apontar o termo “n-dimensional”, uma vez que o nicho ecológico se baseia nesta ideia. Um nicho ecológico nada mais é do que todas essas exigências de espécies multidimensionais. Por outras palavras, o nicho ecológico de uma espécie seria tudo o que envolve a espécie e a faz prosperar e sobreviver onde ela se encontra. Refere-se, em última análise, a todas as variáveis que as afectam na sua vida quotidiana, tanto as variáveis biológicas – o contacto com outras espécies – como as físicas e químicas – o clima e o habitat onde vivem. Um nicho ecológico de uma espécie seria o espectro de alimentos que come ou pode consumir, a hora do dia em que está activa para desempenhar as suas funções, a época do ano e a forma como realiza a reprodução, os predadores e presas, o habitat que tolera e todos aqueles factores físicos e químicos que permitem que esta espécie permaneça viável.
Para dar um exemplo ilustrativo, coloquemo-nos na savana africana. Os principais ungulados de pastagem e os que realizam migrações em massa são compostos por zebras, gnus e gazelas de Thomson. À primeira vista, poder-se-ia pensar que o seu nicho ecológico é muito semelhante: mesmo habitat, mesma rotina, mesmos predadores e mesma comida. O mesmo alimento? Absolutamente não. Durante a migração, as zebras vão em frente, devorando erva alta, que é a pior qualidade. São seguidas pelos gnus, que comem o que permanece de pé, e estas são seguidas pela gazela Thomson, que comem a erva de alta qualidade, que começa a crescer novamente.
CAN TWO SPECIES LIVE TOGETHER WITH THE SAME NICHE IN THE SAME PLACE?
O princípio da exclusão competitiva, proposto por Gause (1934), afirma que duas espécies que ocupam o mesmo nicho não podem coexistir a longo prazo, uma vez que entram em competição por recursos. Assim, num processo competitivo para o mesmo nicho ecológico, há sempre um vencedor e um perdedor. No final, um dos concorrentes é imposto por outro, e então duas coisas podem acontecer: a extinção do perdedor (imagem A) ou um deslocamento de traços para ocupar outro nicho (imagem B). De facto, o princípio da exclusão competitiva está por detrás dos problemas actuais com as espécies invasoras. O nicho das espécies invasoras é muito semelhante ao nicho das espécies nativas e, quando convergem no mesmo habitat, as espécies invasoras acabam por deslocar as espécies nativas, uma vez que são melhores concorrentes ecológicos. Acontece também frequentemente, claro, o oposto: as espécies exóticas são piores do que a sua contraparte e o concorrente não consegue prosperar no novo ambiente.
h2> A EQUIVALÊNCIA FUNCIONAL
Vimos que partilhar o nicho ecológico é sinónimo de ter conflito entre espécies. No entanto, existe uma situação em que o problema não ocorre. A hipótese de equivalência funcional proposta por Hubbell proclama que se os nichos forem idênticos e os parâmetros de vida das espécies (fertilidade, mortalidade, dispersão) forem também os mesmos, nenhum deles tem vantagem competitiva sobre o outro, e a batalha termina em tabelas. Este facto parece ocorrer apenas num ecossistema muito estável numa ilha da floresta tropical do Panamá (Barro Colorado). Diferentes espécies de árvores, como tendo parâmetros de vida quase idênticos, não competem entre elas e estão distribuídas aleatoriamente, como se os indivíduos de diferentes espécies pertencessem à mesma espécie. Além disso, parece que a especiação neste tipo de floresta tropical também poderia ocorrer por acaso, o que teria causado a alta densidade de espécies que abrigam estas florestas.
h2>NEW NICHES, NEW SPECIES
Speciação, ou a criação de novas espécies, geralmente ocorre quando novos nichos ecológicos são criados ou os existentes se tornam desocupados. Em ambos os casos, ocupar um novo nicho ecológico implica uma diferenciação gradual em relação à população inicial para se tornar uma espécie geneticamente distinta. Como exemplo de formação de novos nichos ecológicos, temos o caso da emergência de angiospermas. O seu florescimento abriu muitas novas possibilidades, graças tanto ao aumento da diversidade de sementes e frutos (que, por sua vez, aumentou o número de espécies especializadas) como ao aparecimento de flores complexas, o que permitiu a explosão de muitos polinizadores (facilitando o aparecimento de novos insectívoros). Como exemplo de nicho não ocupado, há o famoso caso da extinção dos dinossauros não pertencentes à fauna. Os dinossauros dominaram muitos nichos, desde ecossistemas terrestres até ao ar, e mesmo o ambiente aquático. Estes nichos vazios foram ocupados por muitos mamíferos, graças à sua elevada fertilidade e plasticidade (flexibilidade para se adaptarem a diferentes habitats). Isso acabou por conduzir a grandes proporções de especiação em pouco tempo, o que é conhecido como radiação adaptativa.
h2>ASSEMBLY OF COMMUNITIES
Como vimos, o nicho ecológico está por detrás de processos ecológicos e evolutivos fundamentais. Todas as comunidades vivas foram hoje formadas graças aos nichos de diferentes espécies. Através da competição, os nichos de espécies sobrepunham-se, e as comunidades foram reunidas como um puzzle. Quando uma peça desaparece, outra toma o seu lugar, desempenhando o papel que a outra tinha na comunidade. No entanto, conhecer todo o nicho ecológico de uma espécie é árduo e, na maioria dos casos, impossível. Tal como nas relações humanas, um conhecimento exaustivo de tudo o que influencia a vida de uma espécie (ou o espaço vital de uma pessoa) é de grande importância para assegurar a sua preservação a longo prazo.
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